uma mulher

meses sem escrever
a rotina tinha vencido várias batalhas
empurrando-a para velhos vícios de sestas e vinho e cigarros à janela

os homens que a procuravam
encontravam um corpo que se escapara pelas madrugadas de solidão

ia lendo e as palavras dos outros soavam distantes na vastidão da alma
regressava aos sonos intermitentes e à bebida ocasional de um copo ou dois
quando ia à janela fumar o gato do vizinho caçava moscas colado ao vidro que separava as varandas

mais tarde quando voltou a escrever
optou por um verso longo e sem quebra
um verso incompreensível onde tudo era dito

rasgou-o e assim deixou de adormecer a meio do dia
deixou de beber e de fumar à janela
o corpo regressara e os homens que encontrava tinham porto para atracar

não escreveu mais e o gato não voltou a aparecer à varanda



Sem comentários: