código genético póstumo

às portas do deserto, perante mais um infinito que me calhou em sorte, duas sílabas inundaram-me a alma

brotaram com a força das inevitabilidades e ressoaram por dentro
ecoando num aperto que já conheço do passado mas que é sempre novo

a paisagem arenosa e o sol a cair no longe do horizonte, o silêncio profundo

tudo isso incompleto

fazias falta

não nós, mas tu
a ideia de ti e do teu pronome vazio a resvalar-me pelos olhos e pelos dedos como os incontáveis grãos desta praia sem mar

depois o sol pôs-se e foi como se mil anos passassem desde essa fugaz solidão da partilha

será tudo isto normal e inocente

das duas sílabas fica a tatuagem invisível
como cicatriz por baixo da pele e da língua
qual código genético póstumo 

2 comentários:

D.Z. disse...

Adorei

Filipe disse...

Obrigado.