Era Julho. Ano da graça de 1993 ou 1994. Fazia muito calor em Moorsel, arredores de Bruxelas, terra de flamengos (mas bruxelenses ainda assim). Estava de férias e sozinho em casa. Durante duas semanas segui pela televisão o Tour de France. Brilhava Miguel Indurain, o homem que diziam ter um coração maior que a maior parte dos mortais, o que fazia que cada batimento bombeava mais sangue, tornando a resistência do espanhol um tratado da medicina desportiva (isso e doping talvez, não sei, esse desalento com as dúvidas sobre o ciclismo foi desgosto que veio mais tarde). Vendo as emissões das televisões francesas que transmitiam a prova (FR3 de manhã, FR2 de tarde, ou vice-versa) fui aos poucos apaixonando-me pelo ciclismo. Mais do que isso, pelo Tour em si. Os sprints, as fugas, as subidas de montanha, as histórias antigas da modalidade, os mitos. Tudo me envolvia, os nomes dos corredores, as cores das camisolas. Foi então que me deu a vergonha de ter 13 ou 14 anos e não saber andar de bicicleta. É verdade. Não sabia. E, no entanto, lá em baixo na garagem, dormia uma bicicleta que me deram para os meus 10 anos, acho. Decidi aprender. Nessa quinzena em que Indurain, sem vencer muitas etapas, dava lições de pedalada, em que Abdujaparov reinava nos sprints das chegadas, em que Virenque era rei da montanha, aprendi sozinho a andar de bicileta. Tinha 13 ou 14 anos. Nada de especial eu sei, mas terá sido a primeira vitória pessoal baseada na paixão. Abriram-se-me várias portas então sobre o reconhecimento do poder da paixão. Poderei tê-lo esquecido em alguns momentos da vida, mas nunca mais o subestimei.
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