Lendo


Terminada esta primeira aventura com a poesia de Borges.


A minha humanidade está em sentir que somos vozes da mesma penúria.

Falam da pátria.
A minha pátria é um ganido de guitarra, alguns retratos e uma velha espada...



A MINHA VIDA INTEIRA

de novo aqui, com os lábios memoráveis, único e semelhante a vós.
Persisti na aproximação da ventura e na intimidade da pena.
Atravessei o mar.
Conheci muitas terras; vi uma mulher e dois ou três homens.
Amei uma menina altiva e branca e de uma hispânica serenidade.
Vi um arrabalde infinito onde se cumpre uma insaciada imortalidade de poentes.
Saboreei numerosas palavras.
Creio profundamente que isso é tudo e que não verei nem executarei coisas novas.
Creio que as minhas jornadas e as minhas noites
se igualam em pobreza e riqueza às de Deus e às de todos os homens.


PARA UMA RUA DO OESTE

Dar-me-ás uma alheia imortalidade, rua sozinha.
És sombra já da minha vida.
Atravessas-me as noites com a tua certa retidão de estocada.
A morte - tempestade escura e imóvel - destroçará as minhas horas.
Alguém recolherá os meus passos e usurpará a minha devoção e esta estrela.
(A distância, como um longo vento, há de flagelar o seu caminho.)
Iluminado por nobre solidão, porá o mesmo anseio no teu céu.
Pôr-lhe-á esse mesmo anseio que sou eu.
Ressurgirei no seu vindouro assombro de ser.
Em ti outra vez:
Rua dolorosamente como uma ferida te abres.


Sei que, mesmo obscuro, qualquer privilégio é da estirpe dos milagres
e grande parte dele provém desta vigília
reunida em redor do que não se conhece: do morto,
reunida para guardar e acompanhar a sua primeira noite na morte.

(O velório desgasta cada rosto;
Os olhos morrem-nos lá no alto como a Jesus.)


Porque o ventre do cemitério do Sul
foi saciado pela febre-amarela até dizer chega;

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