das verdades

Das várias linguagens, a Verdade é uma entidade indizível, inexplicável, irrevelável. Pois se no momento exacto em que se manifesta já ela se metamorfoseou.
No fundo, a Verdade viaja até se mostrar. Seja essa viagem no gesto primitivo de um abraço, mimo ou beijo, seja tatuagem de um verso ou expressão artística, no afago ou vertigem de uma emoção, esse percurso muda a Verdade. Ganham-se outras verdades e perdem-se forçosamente outras do tecido original. E assim é, e assim é bom que seja.
Tudo isto para dizer o seguinte:

ele caminhava junto ao mar, o que por si só é todo um manifesto. Chegou à conclusão de que tudo deixa um rastro, um eco ou um traço de sombra e penumbra. Rastro invisível, eco inaudível ou penumbra ténue. Mas nenhum testemunho se apaga de vez. As coisas acontecem. E mesmo depois de acontecerem, mesmo após o esquecimento e de milhões de anos de erosão, sob a pele da existência uma cicatriz delicada não deixa de se desenhar num sopro, numa subtil textura levemente rugosa.
Os venenos destilam fel eternamente e os variados antídotos que vamos criando e tomando, ajudam, sim, a manter a alma no seu voo mas a gravidade é a lei teimosa que prevalece e, a longo prazo, nada evita a derradeira queda.

Mas a beleza de tudo isto é que a queda não é queda pois não há cimo ou baixo no cosmos, as quedas vêm de todos os lados.
Dizem eles, até, que devagar, ao ritmo de incomensuráveis medidas de tempo, o universo desacelera, que a gravidade definha e se extingue, que depois do futuro restará somente um caldo morno no marasmo disto tudo, um pântano espacial.

Aos olhos dele, que caminhava junto ao mar, esse tal futuro seria a ausência dela. Ele já lá estava.

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