Pelo menos em
Março de 2011, já eu tinha iniciado a leitura de Moby Dick na versão original. Um ato que não pensei durar mais de uma década, mas que quase de imediato soube ser uma loucura.
Na minha vida de leitor, recordo apenas um livro que comecei e não terminei (Ulisses de James Joyce, também na versão original).
Moby Dick, a bem ou a mal, eu decidi, desde cedo, que iria lê-lo de uma ponta à outra, nem que para isso me afogasse. E afoguei-me várias vezes em interrupções sem conta.
A imagem acima foi ontem à noite, regressado de uma ilha, com o livro na mão e finalmente lido. Agosto de 2024. Pelo menos 13 anos de leitura.
Das centenas de capítulos e páginas, ficou-me um infinito de léxico marítimo por decifrar, fiquei-me pela intuição do que podem significar, um périplo de um barco e de uma tripulação, de seres marinhos, de horizontes sem fim e ondas do tamanho de catedrais. Ficou também a sensação de que as noites em mar alto são de um breu extremo, que mesmo alumiadas por lamparinas a óleo, essa luz tem negrume e a humanidade move-se por sombras tão densas que nem uma centelha faísca.
O que me fica também é o sabor a sal e a noção exata do que é uma obsessão.
A obsessão como fatalidade.
Seja a do autor que se agarrou à escrita, nota-se que exigiu uma entrega maníaca, uma teimosia irredutível, seja à minha leitura de náufrago, que engoli a espaços de meses e meses sem vir à tona, seja até à loucura de um homem, um capitão numa perseguição compulsiva em busca do que ele julgava ser uma vingança mas não era mais que o reconhecimento de uma inevitabilidade.
Foi-se o barco, foi-se a tripulação e um homem amarrado a uma baleia branca, caindo nas profundezas oceânicas. Sepultados todos num fado inexorável.
Sobreviveu Ishmael e o relato.
Chamem-me Ishmael.