pelos versos que escrevo desde sempre

é sempre assim
no limite da noite
naquele momento que passa a instante
no lugar ligeiramente ébrio das coisas
é aí que aqui chego

e chego inteiro e nu
despido de tudo e cheio de nadas

atabalhoado no explicar do que sinto
mas sobretudo do que quero dizer

mas não quero dizer nada
sinto somente
comungo

e para ser sincero
tudo isto resume-se a uma coisa

sinto a tua falta hoje
porque estás em Paris

fico-me pelo teu cheiro na almofada
e pelos versos que escrevo

pelos versos que escrevo desde sempre

tu

em tempos demorei-me no teu pronome
resvalei por essa silaba em tua busca
com a sede toda do meu amor por ti

disse-o em voz baixa na sala silenciosa da madrugada
ensaiando uma tua aparição repentina

escrevi-o milhares de vezes
repetindo-o até me doer a mão e o punho

quis tatuá-lo discreto no meu corpo
ele que se me coseu nos lábios e língua e que me incendiou os olhos

esse teu pronome
tão teu que contigo se confunde
como se já fosses também

tu

nos silêncios densos da solidão

então
fazes escala entre palavras
voas nos silêncios densos da solidão
e aí quando não há alma que se aviste
e somente o eco quieto do abandono ecoa
encontras-te de novo
e de mãos caídas sobre a noite
os olhos a vibrar pelo infinito
mordes esta coisa de estar por aqui
sangras-te e salivas com o espasmo a percorrer-te o ser
não podes estar mais vivo nem mais poético do que agora

mesmo quando o agora dura um nada

foi preciso

ao silêncio do qual nunca saíste
chegaste uma noite sem o saberes
foi numa madruga precisa de solidão em que o teu cansaço venceu e desmoronou-se num sofá

dormiste caído e abandonado pelas sombras

o vento louco lá de fora a rasgar a noite
uma manta imensa de nevoeiro a emudecer a janelas

foi preciso uma tempestade e o mar virado do avesso
para que naufragasses uma vez mais
dando à costa da quietude
moribundo
reencontrado e reencarnado

Confrade

Da gratidão.
Ao Douro, essa " beleza absoluta", às suas gentes e ao Vinho, ao do Porto em particular, o melhor de todos.
À família, aos meus.
Ao Amor, a ela e seu sotaque e seu calor.
Mas, também e sobretudo, a algumas pessoas concretamente. À Ana, ao Euan, ao Pedro e à Isabel, primeiros e decisivos mentores no trajeto profissional, que de trabalho passou num instante a paixão.
À Symington, a minha casa.

Por fim, o brinde como Confrade:

Pelo Vinho do Porto, pela Confraria, pelos Confrades.
Obrigado.


Grateful.
To the Douro, that "beleza absoluta", to its people and to the Wine, Port in particular, the best of all.
To my family, to my kin.
To Love, to her and her accent and her warmth.
But, also, to some specific people. To Ana, Euan, Pedro and Isabel, the first and decisive mentors in my professional path. A job turned into passion in an instant.
To Symington, my home.

And finally, the toast as a Confrade:
For Port Wine, for the Confraternity, for the Confrades.
Thank you.

De la reconnaissance.
Au Douro, cette "beleza absoluta", à ses habitants et au Vin, au Porto en particulier, le meilleur de tous.
À la famille, les miens.
À l'Amour, Elle et son accent et sa chaleur.
Mais, aussi et surtout, à certaines personnes. À Ana, Euan, Pedro et Isabel, les premiers et décisifs mentors de mon parcours professionnel.Le boulot viré passion en un instant.
À Symington, ma maison.

Et enfin, le toast en tant queConfrade :
Pour le Vin de Porto, pour la Confrérie, pour les Confrades.
Merci.

reencontro

pela manhã quando faz sol e é feriado ou domingo
noto que as gaivotas gostam de repousar na relva das rotundas pequenas

passo e contorno e elas lá estão
de penas viradas ao centro
alheias aos carros debicando ervas e feixes de luz

até que voam quando regressa o trânsito ou a segunda-feira
desconhecendo que não passou tempo algum entre o último verso e o primeiro
que o que brota nem sempre se manifesta em palavras lidas
que aquilo que não é revelado é tão mais imenso quanto o que acaba por surgir

nem tudo o que escrevo é para aqui chamado
nem sempre é um feriado ou um domingo de manhã
muitas vezes faz noite
e é tão densa que por muito que nela entre
fico à tona
na borda da madrugada
observando de fora
não sei se a espiando se ela me espiando a mim
queimando a insónia mesmo que dentro do sono
porque os sonhos são tão reais que queimam os olhos e a mente

o que aconteceu até agora
desde o último silêncio
foi só uma eternidade que se calou
ou que se declamou numa das muitas gavetas com cadernos que de tão cheios e inúteis mais sentido fariam se estivessem vazios e mudos

enfim
as rotundas pequenas estão vazias de novo
as gaivotas voam longe
e quem sabe
talvez te reencontres por aqui