Falas para o silêncio de um anfiteatro vazio. Cenário ideal para o que tens a dizer, pois o vazio para o qual falas é da mesma espécie do teu.
Dos silêncios forçados
Dos silêncios forçados pelas decapitações, brotam muitas vezes vozes ainda mais profundas e duradouras. A seiva lavra no invisível, no olvido momentâneo, no negrume dos âmagos, na quietude imensa das cavernas. Não há grito maior do que aquele que é atirado pelo símbolo, pela metáfora, pois ele resvala pelo mundo inteiro ecoando em cada esquina, em cada beco, em cada ravina, projectado como sombra infinita à hora do zénite perfeito.
Da foz à nascente
Se dos milagres que nos chegam, o espanto maior é percebermos que ao nos chegarem são esses mesmos milagres mais o eco de todos os locais por onde passaram, o milagre maior é aquele que não nos chega mas que já lá está há milénios. Como se no momento em que o acolhêssemos entenderíamos de imediato que ele já lá estava, que ele já era e é. No fundo, nesses casos, somos nós que chegamos a ele, nós e todos os ecos por onde passámos para a ele chegarmos. O amor é isso, um encontro com o que já lá estava antes de tudo e para lá de tudo. Uma história de sombras e penumbras que a luz vai desenhando da foz à nascente e não o contrário.
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