Começou cedo, mas gosto de acreditar que este tipo de coisas (as paixões) já começam antes de tudo, no eterno. Teria 3 ou 4 anos e, aos domingos, lembro-me do meu avô Fernando de rádio no ouvido a beber o relato. Era o Porto. Lembro-me do meu outro avô, Francisco, contar que fora árbitro e cronometrista de várias competições (atletismo, ciclismo, natação) e que muitas foram no velhinho estádio e antigas piscinas das Antas. Lembro-me do meu pai falar que foi juvenil no FC Porto e do primeiro treino que fez nesse mesmo estádio. E lembro-me de ir às Antas, no meio de uma multidão imensa, rodeado do meu tio-avô Américo e do meu pai para ver o Porto -Dínamo de Kiev em 1987, meias-finais das Taças dos Campeões Europeus que o Porto venceria na Áustria com um calcanhar. Nesse jogo frente aos ucranianos, o Futre marcou um golo com a ajuda do defesa e recordo ainda hoje do festejo louco que o esquerdino fez. Trepando o arame farpado para ir ter com os adeptos. O André marcou o outro.
Aquando da final, estava em Bruxelas com os meus 7 anos e com a minha querida avó Beatriz, os meus pais, esses, estavam em Viena a ver o jogo ao vivo. O Porto sofreu um golo cedo e a minha avó vendo-me triste disse "não te preocupes que a Nossa Senhora vai ajudar o Porto", fiquei ainda mais nervoso e, se não me engano, fui a chorar para o quarto. Mas certo, certo, é que a "Nossa Senhora" lá foi parar ao calcanhar de um muçulmano chamado Madjer e deu o empate, e pouco depois foi parar ao voo de um brasileiro pequenino chamado Juary e deu a vitória. A minha avó teve razão, e lembro-me de na sala festejar e ver o Carlos, um amigo dos meus pais que morava connosco na altura, de joelhos em frente à televisão a festejar também.
Meses depois, é a memória do meu pai a festejar em Bruxelas, de madrugada, a vitória da Intercontinetal. Anos depois no Algarve com um bom amigo, recordo o festejo em cima de um comboio que ia para a praia festejando a vitória frente à Lazio para a UEFA e meses depois em plena Avenida Brasil, de onde escrevo, recordo-me de estar a fazer a barba no quarto-de-banho e ouvir vindo da sala, amigos a festejar o terceiro golo do Porto frente ao Celtic (quando foi o prolongamento não consegui ver mais o jogo com os nervos e decidi ir fazer a barba) e de ir a correr com meia barba por fazer festejar com eles. E toda a noite até ao Dragão onde chegaram os vencedores. Um ano depois, de novo com amigos, recordo os três golos frente ao Mónaco e de mais uma noitada na Alameda das Antas esperando de novo pelos campeões.
Lembro-me também de derrotas: frente à Sampdoria na Taça das Taças, frente ao Barcelona nas meias-finais da Liga dos Campeões, frente ao Famalicão nas Antas no último minuto, frente ao Boavista do Jaime Pacheco também nas Antas, frente ao Benfica há semanas atrás, frente ao Shalke nos penáltis. Lembro-me de empates, de jogadores, de treinadores, de jogadas e de golos.
No fundo, esta memória para o futuro, é apenas a demostração atabalhoada do que é ser-se de um clube. fSou-o pela família, por amigos e pela cidade. Outros terão histórias parecidas, outros diferentes. Há coisas que não se explicam.
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