nunca nada é sempre tudo

nunca nada é sempre tudo
nem tudo tem de ser sempre alguma coisa

e neste aparente nó edifica-se uma forma de se estar
estoica e serena
porque vamos estando em cada momento

e navegando entre vários esquecimentos
à deriva entre olvidos
de pouco servem certezas absolutas cheias de teimosia

não significa isto que não se nade nesse mar
somente se entende que não basta esbracejar
para não se morrer afogado

um poema que é mentira

um poema que é mentira
pois não se agarra o que é autêntico
ele tem coordenadas presas ao tempo
esculpido em cronos
feito pó poeira e bruma no instante seguinte

um poema que é mentira
como o são todos pois vivem na memória etérea
nas ruinas de uma lembrança

versos que não são mais
mesmo que lidos de novo porque a voz faz-se eco
e o eco extingue-se em murmúrio

poesia que é dúbia
que as certezas são feitas de ilusão

um poema que é mentira
num mundo de tanta verdade
resiste no embuste como símbolo solitário de exatidão

um poema que é mentira
e por isso
livre