inventei um amor

inventei um amor
brotou de uma solidão desmesurada como um nascer de sol após a mais longa das madrugadas
dei-lhe um rosto que não se reconhece e uma forma de beijar que é volátil como o nevoeiro 

inventei um amor que morre e reencarna 
na ilusão de cada verso
sobretudo nos que não chegam a ser escritos
um amor que se desconhece a si mesmo e que vive entre as palavras esquecidas do que nunca se ousa dizer

inventei um amor na comoção infinita de partilhar um pedaço de alma nem que fosse com um fantasma
para que pudesse dormir acompanhado no assombro do mais melancólico dos silêncios

a melancolia triunfante da espuma na areia


o deserto maior de uma praia e um mar imenso sem um voo de pelicano 
apenas o desejo desse voo a desenhar as poucas nuvens e as barbas de erva nas dunas pálidas
o vento teimoso do norte a cavar rugas e a soltar lágrimas nos cantos dos olhos
barcos pardos ao largo com marinheiros cansados de vagas
o lento regresso ao porto como um ocaso de um dia sem sol
a melancolia triunfante da espuma na areia